Impressões do antes (ou, eu irei, ele irá...eles irão). No princípio era o verbo, a verba, e depois o destino. Para além de assumir a tradução portuguesa homónima do verbo propício à viagem, quando o Irão se torna destino e não verbo conjugado no futuro do indicativo, é pelo fascínio que ele provoca que se decide roer caminho até lá! Por ser um país embriagado em costumes alimentados pela sua língua - o farsi, pela sua história, por aquela religião - o Zoroastrismo, pelo seu povo, e até pela sua polícia, a dos costumes. Durante trinta dias vestimos essa cultura com vontade de saber o que é ter aquela visão, esta audição, muito paladar, algum tato e um olfato persa, no masculino e no feminino. Fazemos as malas do estrito necessário, dobrando a novidade e o inesperado para deixar espaço para o que trouxermos de lá.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Zurkhaneh, o desporto nacional persa

Proveniente de uma técnica milenar, acredita-se que o Zurkhaneh tenha origem no treino de guerreiros prontos a defender o país das diversas ameaças ao império persa. Apesar de ter o nome de Varzesh-e Pahlavani ou Varzesh-e Bastani – desporto dos heróis – o desporto tradicional persa por excelência é habitualmente conhecido por Zurkhaneh (zur-rra-né para quem quiser treinar a sua pronúncia). Pois Zurkhaneh (casa da força) é o nome que se dá ao edifício que acolhe a prática desta atividade.

Apesar de constituir, em pleno século XXI, uma modalidade olímpica, o Zurkhaneh alimenta-se da riqueza espiritual do Sufismo, dos rituais do Mitraísmo e de um certo heroísmo nacional. Com a introdução do Islão na cultura persa, desde os Safávidas até hoje, uma dimensão espiritual e teatral tornam-se inseparáveis da corporal. Ultrapassando a esfera física, o Zurkhaneh não é só um desporto. A sua prática é elevada a valores morais, espirituais, filosóficos e religiosos da civilização persa, muito além do exercício físico aparente ao olhar virgem de um viajante.

Existentes desde a dinastia Parta (250 a.C. - 224 d.C.), as Zurkhanehs eram salas onde os patriotas reuniam-se para discutir técnicas de combate contra o inimigo. Os invasores destruíam frequentemente as Zurkhanehs – casas de força, cavalaria e generosidade. No entanto, no Irão, a construção de Zurkhanehs continuou.

Atualmente, estas decoram-se como verdadeiros templos de veneração. Por pequenas portas revelam-se salas intimistas com paredes repletas de fotografias de heróis nacionais e de retratos de grupo dos atletas da cidade. No chão, percorre-se com o olhar centenas de instrumentos pouco convencionais usados para cada exercício (Mīl, Kabbadeh, Sang e Takhteh e Shena). Estes são praticados num recinto em forma octogonal com um metro de profundidade e 10 a 20 metros de diâmetro. Sentado numa plataforma chamada Sardam, o Morshed, grávido de um tombak (tambor) conduz cada exercício de culturismo, ginástica e luta com ritmo e incentivo. Ao toque do sino (zang) inicia-se e termina-se cada exercício. O Morshed, ao ritmo das percussões, dedica as suas cordas vocais ao canto de versos de poesia tirados essencialmente do Shahnameh – Livro dos Reis – escrito pelo grande Ferdowsi.

Quando Portugal estava a dar os seus primeiros passos no mundo do futebol, próximo das últimas décadas do século XIX, o Zurkhaneh atingia o seu auge em plena dinastia Qajar, tendo como principal impulsionador Nasser al-Din Shah (1848-1896). Quando o primeiro jogo opôs Portugal a Inglaterra, na Praça de Touros do Campo Pequeno em 1889, novas casas de força estavam a ser construídas em Teerão e por todo o país. O futebol atraia a alta sociedade portuguesa, o Zurkhaneh era o favorito do Shah. Porém, vítima de síndrome de fanatismo da bola, o Irão destronou o seu desporto nacional, substituindo-o pelo futebol.

Na altura de Nasser al-Din, no dia de Noruz (o ano novo persa), a 21 de março de cada ano, um campeonato era organizado. Ao campeão era entregue uma pulseira – bazou band. Esse ornamento de sucesso propulsionava ao atleta tornar-se herói nacional, verdadeiro elogio à memória de lutadores nacionais da mitologia persa. Grandes atletas, tais como Jahan Pahlavan Takhti, cresceram no mundo do Zurkhaneh para serem reconhecidos mundialmente. Foi na cidade de Helsínquia que o Irão, graças a Takhti levou para casa, pela primeira vez, uma medalha de prata nos Jogos Olímpicos de 1952.











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